segunda-feira, 9 de março de 2009

Andarilho no mundo


















Sou esquinas
cruzamentos em ladeiras
sou paralelepípedos
cimento e muros
poeira e musgos
e sou também paisagem

sigo admirando,
plantas que vou vendo
vendo tanto que sendo
indo que apenas ando

Desprevenido vou que tento
aos poucos percebo sutil
aquilo que eu mesmo invento
e vendo, querendo, sabendo
termino me desconhecendo

porque sempre que escrevo
e mesmo quando apenas descrevo
falo daquilo que sou
porque sou incapaz de escapar disso

enquanto sendo, sei-me que vou
vi-vendo
muito além do óbvio porque estou vivo
e era isso
era isso
precisava falar nisso
nisto aí que não sei como falar

ao subir ladeiras
desço profundo no passado
meu e da cidade

nosso

e a plenitude caminha
sabiamente insatisfeita
como uma cadela ainda jovem
que se realiza, ainda que em pânico
no escapar desprevenido
de um coleira que se solta
um susto de liberdade
um sabor de coragem e medo
que de repente volta e se revolta
Sou este cão
neste exato momento
entre a coleira
e o deja'vú
de uma tal liberdade

sou esta exitação
num olhar que se desprende
solto
entre o caminho e a paisagem

Sou doméstico e sou selvagem

sou amor somado à libertinagem
Dor que se estica em sabedoria
Susto que se converte em alegria
Saudade que desembarca de longa viagem

Sou sonho em plena realidade
e pleno
mesmo em um mundo de crueldade
sou amor consciente
e paixão à beira da loucura
sou o sabor do onipresente
e o som vivo de uma textura

Esquinas
ladeiras
paralelepípedos
muros
tijolos
entulhos
becos
escadas
praças
bairros
mundo

porque sempre que escrevo
e mesmo quando apenas descrevo
falo daquilo que sou
porque sou incapaz de escapar disso

a trajetória da vida
é portanto como uma onda
que é uma energia infinita
e ao mesmo tempo redonda

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